Por maioria de votos, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu parcialmente a denúncia em que o Ministério Público Federal (MPF) acusa o senador Renan Calheiros (MDB-AL) dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O julgamento do Inquérito (INQ) 4215, iniciado no último dia 19, foi concluído na sessão desta terça-feira (3).
A denúncia, decorrente de fatos investigados na operação Lava-Jato, imputava a Calheiros o recebimento de vantagem indevida sob a forma de doações eleitorais oficiais feitas pelas empresas NM Engenharia e pela NM Serviços aos diretórios do PMDB (atual MDB) em Aracaju (SE) e no Tocantins e ao Comitê Financeiro do PSDB em Alagoas, a pedido do então presidente da Transpetro, Sérgio Machado. A Turma acolheu a denúncia apenas na parte relativa aos fatos relacionados à doação ao diretório do Tocantins. A arrecadação de vantagens indevidas junto aos empresários, que fechavam contratos milionários com a subsidiária da Petrobras, e a destinação do dinheiro aos expoentes do PMDB seria, segundo a denúncia, a condição para que Machado permanecesse no cargo.
Indícios
Prevaleceu o voto do ministro relator, Edson Fachin – seguido pelos ministros Celso de Mello e Cármen Lúcia. Segundo ele, no ponto relativo à doação eleitoral ao Diretório Estadual do PMDB no Tocantins nas eleições de 2010, a denúncia demonstra que o depoimento de Machado tem respaldo em indícios de que a doação de R$ 150 mil, feita em 27/9/2010 pela NM, seria a concretização de pagamento de vantagem indevida a Calheiros.
Um dos indícios é o bilhete em que o ex-presidente da Transpetro havia anotado os dados bancários do diretório estadual do partido, o nome e o telefone do intermediador Bruno Mendes, advogado e ex-assessor do senador alagoano. Os atos também revelam que o dinheiro foi destinado ao senador Leomar Quintanilha (PMDB-TO), aliado de Calheiros. Em 2007, na presidência do Conselho de Ética do Senado, Quintanilha arquivou sumariamente duas representações contra Renan Calheiros nas investigações sobre pagamento de pensão por uma empreiteira em favor de sua filha com a jornalista Monica Veloso.
Ao acompanhar integralmente o voto do relator na sessão de hoje, o ministro Celso de Mello destacou que há elementos indiciários mínimos convergentes para a prática do crime de corrupção passiva suficientes para autorizar a instauração da ação penal. “O depoimento do agente colaborador, embora não legitime, quando for o único elemento incriminador, a condenação penal, pode autorizar a formulação e o recebimento de denúncia, especialmente se os elementos veiculadores da acusação se acharem, como entendo ocorrer no caso, minimamente corroborados por fontes autônomas de prova”, afirmou. O ministro também acolheu parcialmente a denúncia em relação ao crime de lavagem de dinheiro. Para ele, o pagamento de vantagem indevida travestido de doação eleitoral oficial pode configurar o delito.
Coube à presidente da Turma, ministra Cármen Lúcia, desempatar o julgamento, após os votos dos ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes pela rejeição integral da denúncia. Ao acompanhar o relator, ela destacou que no Brasil, ainda que a indicação e a ocupação de cargos públicos sejam formalmente uma prerrogativa do chefe do Poder Executivo, no chamado “presidencialismo de coalisão” há a possibilidade de intermediação de parlamentares, que potencializam a indicação de determinados nomes. Com isso, surge um débito de quem exerce e se mantém no cargo em relação a quem o indicou, fortalecendo tal parlamentar.
Rejeição integral
Para o ministro Ricardo Lewandowski, que votou pela rejeição da denúncia, a peça acusatória é muito genérica e não descreve os atos de ofício supostamente praticados por Renan Calheiros em retribuição às vantagens indevidas disfarçadas de doações eleitorais feitas pelo grupo empresarial que detinha contratos com a Transpetro. Segundo o ministro, ainda que fosse reconhecida a indicação e o apoio político de Renan como condição para a manutenção de Sérgio Machado na presidência da Transpetro, essas condutas, por si só, não caracterizam ato de ofício relativo à função parlamentar. “O ato de indicar, manter ou exonerar o presidente da empresa não integra as atribuições funcionais do cargo de senador da República”, afirmou.
O ministro Gilmar Mendes também votou no mesmo sentido, por entender que, além da falta de outros elementos e provas que corroborem a narrativa dos colaboradores, a denúncia contém “vícios e fragilidades”. Para ele, é absolutamente inverossímil que Renan Calheiros tenha destinado recursos para a campanha eleitoral de um adversário político de sua família em Alagoas em 2010. Uma das imputações da denúncia, rejeitada também pelo relator do inquérito, apontava que R$ 150 mil doados pelo grupo NM ao Comitê Financeiro do PSDB em Alagoas foram transferidos ao candidato ao deputado estadual Inácio Loiola Damasceno Freitas. Segundo o ministro Gilmar, não há nos autos qualquer elemento de prova que indique que Renan tenha solicitado vantagem indevida ou tivesse ciência ou concordasse com a solicitação. “Tenta-se a fórceps adequar as palavras do colaborador à hipótese investigativa”, concluiu.
VP/AD//CF
Leia mais:
26/11/2019 – Relator vota por recebimento parcial de denúncia contra Renan Calheiros por corrupção e lavagem de dinheiro
Source: STF